terça-feira, abril 15, 2014

uma definição

o amor é uma luz
que atravessa de noite o nevoeiro

o amor é uma carica
pisada a caminho
da casa de banho

o amor é a chave perdida da tua porta
quando estás bêbedo

o amor é o que acontece
um ano em dez

o amor é um gato esmagado

o amor é o velho ardina
parado na esquina que
largou a profissão

o amor é o que tu achas que a outra
pessoa destruiu

o amor é o que desapareceu no
tempo dos couraçados

o amor é o telefone a tocar,
a mesma voz ou outra
voz mas nunca a voz
certa

o amor é traição
o amor é o fogo que consome
os sem-abrigo numa viela

o amor é aço
o amor é a barata
o amor é uma caixa de correio

o amor é chuva a cair no telhado
de um velho hotel
de Los Angeles

o amor é o teu pai num caixão
(que te odiava)

o amor é um cavalo com uma pata
partida
a tentar levantar-se
perante uma assistência
de 45.000 pessoas

o amor é o nosso modo de cozer
como a lagosta

o amor é tudo aquilo que dissemos
que ele não era

o amor é a pulga que não consegues
encontrar

e o amor é um mosquito

o amor são 50 granadeiros

o amor é uma arrastadeira
vazia

o amor é um motim em San Quentin
o amor é um hospício
o amor é um burro parado numa
rua de moscas

o amor é um banco vago ao balcão

o amor é um filme do Hindenburg
a encarquilhar-se em pedaços
um instante que continua a gritar

o amor é o Dostoiévski a dar
à roleta

o amor é o que rasteja
pelo chão

o amor é a tua mulher a dançar
agarrada a um desconhecido

o amor é uma velha
a roubar um pedaço de
pão

e o amor é uma palavra usada
demasiadas vezes e
demasiado
cedo.

Charles Bukowski
(tradução de Vasco Gato)